Capítulo 13 – Dum spiro spero.

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Apesar de não nutrir tantos sentimentos bons pelo pai, Mike se sentia muito estranho naquela manhã. Abraçado a sua mãe na antiga sala da casa que um dia também foi sua, tentava consolá-la de todas as maneiras possíveis.

Seu pai, homem duro e teimoso, desde o início, não acreditava muito na existência de um vírus que poderia se tornar fatal. Ele vivia falando para quem quisesse ouvir, que não passava de um plano sórdido da China para acabar com a economia mundial e que ele não seria refém dessa história.

Se negava a usar máscara ao sair, não utilizava álcool em gel e se dependesse dele, ficava “passeando” nas ruas todos os dias. Chegou a receber mais de uma multa por descumprimento das regras sanitárias e por várias vezes foi chamado a atenção por policiais locais.

Sua esposa, falava o tempo todo que ele tinha que se cuidar, mas para variar, ele nunca a ouvia e acabavam inclusive, brigando por muitas vezes por causa disso.

Meses depois, a insensatez acabou cobrando seu preço e o Sr. Furter, que já tinha o pulmão lesionado devido à anos intensos de parceria com seu charuto, se contaminou com o novo vírus e se negando a procurar ajuda médica nos primeiros dias, relutava em aceitar sua condição, afirmando o tempo todo que se tratava de um simples resfriado.

Passados 7 dias dos primeiros sintomas, ele já não conseguia caminhar, pois o cansaço o dominava, cada músculo do seu corpo demonstrava a luta dura que ele estava travando contra a febre, a cama passou a ser sua única companheira, já que sua esposa evitava chegar próximo a ele para não se contaminar e usando máscara o tempo, fazia o que podia para ajudar, mesmo sobre  xingamentos daquele homem.

A falta de ar o dominava, o pulmão não conseguia sugar o ar que tanto ele precisava, quando ele parou de comer, para ela, foi a gota d`agua e mesmo o contrariando, ligou para o setor de saúde e pediu para que uma ambulância o buscasse e o levasse para o hospital, ela não queria perder o seu marido.

Devido ao perigo de contaminação, os paramédicos a proibiram de acompanhá-lo e sentindo o frio da solidão e a sensação horrível da incapacidade, pegou o telefone e ligou para Brenda para contar o que estava ocorrendo e assim que a filha atendeu, começou a chorar.

Já no hospital, Sr. Furter, foi imediatamente direcionado a UTI e com a voz rouca, quase inaudível, antes de ser entubado, pediu para ligar para seus filhos.

Ele olhava para o celular e a falta de oxigenação não permitia que ele conseguisse focar os olhos no teclado, mas mesmo que ele conseguisse tocar nos números, não tinha a menor ideia para qual número ligar, depois de todos estes anos, ele nunca se preocupou em saber de seus filhos e nem conhecia seus netos. Só sabia da existência deles, pois sua esposa insistia em contar, o que ele fazia questão de esquecer.

 Mas naquele momento, ele só pensava como havia sido tolo, tolo ao não respeitar seu filho, por não perdoar Brenda e por se recusar a conhecer seus netos, foi ignorante demais por não aceitar, inclusive, que o coronavírus realmente existia, e que agora, era o que o estava levando, de maneira tão cruel. Talvez ele merecesse, ele pensava. Mas a esperança de ter mais uma chance, permeava em sua mente. Ele pensava que iria fazer diferente, ele cuidaria melhor de sua esposa que sempre esteve do seu lado, ele aceitaria o filho como ele é e sentiria orgulho do homem que se tornou. Daria um grande abraço em Brenda e brincaria no jardim com os seus netinhos. Ahh, quanto tempo ele tinha perdido por sua ignorância. E esses pensamentos e imagens foram dando lugar a um pesadelo onde todos viravam as costas para ele e em meio a seus gritos calados imaginários, caminhavam em sentido contrário, ele tentava agarrá-los com suas mãos, mas elas iam derretendo como tinta, as imagens deles iam sumindo no horizonte e vendo suas mãos derreterem, percebia que também estava sumindo, daquele lugar, daquele momento, das memórias deles, a dor do pesadelo de não ser mais lembrado por ninguém, se revelava através das lágrimas, que podiam ser vistas apenas pelos médicos que haviam acabado de o sedar para iniciar os procedimentos para intubação.

Brenda, preferiu não ir à casa da mãe, pois ela não queria se expor e expor seus filhos a qualquer risco de contaminação, então Mike e Thony se predispuseram a ir e dar todo o apoio que a mãe de Mike precisasse. Afinal Mike já esperava que este dia fosse chegar.

Ali na sala, Mike só conseguia abraçar sua mãe e dar todo seu amor. Dizia que estava com saudade e que ela não ficaria sozinha.

Ela olhava para ele com um olhar carinhoso, mas com uma tristeza jamais vista. Apesar de o pai ser um grosso e totalmente ignorante, o amor que ela sentia por ele era algo visceral.

Fazia três dias que ele estava internado e nenhuma notícia de melhora havia sido dada até o momento. O desespero de não poder falar com ele e não poder ao menos vê-lo, estava deixando a mãe doente, mesmo não tendo sido contaminada, parecia que ela estava perecendo junto com o pai.

Ela se recusava a comer e o pouco que caminhava era do quarto para a sala para se sentar perto do telefone aguardando alguma notícia e de joelhos no chão e mãos para o céu, rezava, emocionada, pedindo a Deus para que salvasse a vida de seu marido.  

Mike já se preparava para o pior e já fazia planos com Thony para levar a mãe dele com eles para São Francisco. Pensavam na longa viagem e como iriam fazer, já falava com Brenda sobre a venda daquela casa, enfim, para ele, o pai já estava morto, só faltava o atestado de óbito.

Antigamente, talvez, ele até acharia isso bom, para ele seria menos um homem ignorante no mundo, mas naquela situação, vendo a mãe daquele jeito e passando as mãos nas fotos que estavam em cima da lareira, onde continha ou só o pai ou o pai e a mãe, percebeu, que queria ter estado mais perto deles ao longo desses anos. Começou a imaginar seu pai o perdoando e o abraçando, correndo atrás dos netinhos, imaginou até todos sentados em volta da mesa em um dia de ação de graças, se divertindo com as velhas piadas de caserna que seu pai costumava contar quando eram crianças.

Uma lágrima escorreu por seu rosto e apesar de não ter sido ele que o “expulsou” daquela vida, ele se arrependeu por não ter tentado se reconciliar por todos estes anos e o sentimento de impotência, que o tempo havia acabado e que já não se podia fazer nada, nem dar um último adeus, se manifestava através de uma queimação no peito que se espalhava até a boca do estômago. Foi aí que percebeu que a pior doença não era aquela que estava levando seu pai a morte naquela cama de hospital e sim o vírus da intolerância que havia contaminado seu pai há muitos anos atrás, juntamente com a mágoa e ressentimento que havia se espalhado por toda a família.

Thony, percebendo o olhar longe de Mike, caminhou silenciosamente até ele e lhe abraçou acomodando sua cabeça em seu ombro, sentindo o calor do seu corpo, Mike desabou a chorar, o apertando, por vezes o empurrando, com movimentos de desespero.

Thony só disse:

- Você não é culpado de nada. Você só quis ser feliz.

E abraçando mais forte seu amor, Thony, se manteve ali, em silêncio, acariciando os cabelos de Mike, enquanto ele colocava anos de ressentimento para fora.

 

J.D., depois de todos esses meses, já havia gastado quase todas as suas economias e estava começando a ficar preocupado com a situação das meninas da boate. Sem clientes e sem perspectiva, ele só pensava que precisava dar um jeito.

Karine, por muitas vezes, nestes meses, havia falado com J.D. principalmente quando os arquivos haviam sumido, inclusive desconfiando que ele os havia roubado, mas depois de muita conversa, percebeu que J.D. não tinha nada a ver com isso e uma amizade começou a se solidificar. Karine, já na casa dela, tinha até comentado com os seus pais sobre ele, os quais ficaram interessados em oferecer um trabalho na empresa, mas J.D. naquele momento havia negado.

Mas se encontrando naquela situação difícil, estava começando a rever sua decisão. Ele não sabia se ainda precisavam dele, mas tinha que tentar, ele tinha muitas bocas para alimentar.

Logo pela manhã, J.D. procurou por Karine, em um chat que eles tinham desenvolvido somente para os dois, pois como às vezes eles discutiam assuntos técnicos no grupo, o pessoal reclamava  que aqueles assuntos tiravam o foco dos assuntos principais.

Karine, que estava terminando o banho, ouviu o computador apitar e sabendo que era J.D. pois havia colocado um som diferente para suas mensagens, saiu enrolada na toalha apressada e esquecendo de desligar a câmera, atendeu a chamada.

J.D., não ficou constrangido ao vê-la de toalha pois mulheres nuas, em sua boate era o que mais ele via, mas a achou linda, toda enrolada e um pouco molhada e sem maquiagem, a elogiou:

- Bom dia, minha querida. Tudo bem? Nossa, que linda, você deveria ficar mais assim ao natural, você tem um rosto perfeito.

E Karine, sem graça, sentindo suas bochechas queimarem, caindo em si que estava com a câmera ligada, a desligando imediatamente, pedindo desculpas pelo ocorrido. Ela nunca aparecia sem maquiagem.

- Você não precisa se envergonhar, realmente você é muito bonita, a maquiagem esconde a sua verdadeira beleza. Confie em mim.

- Obrigada amigo. Se sentindo estranha com o elogio, mas feliz, mudou de assunto para disfarçar seu constrangimento.

- O que eu posso te ajudar logo cedo? Aconteceu alguma coisa?

- Lembra daquela proposta que você me fez há alguns meses para trabalhar na empresa do seu pai. Então, eu resolvi aceitar. Será que ainda teria vaga para mim?

- O que o fez mudar de ideia? Perguntou Karine curiosa.

- A necessidade meu anjo. Minhas reservas estão acabando e eu cuido de muitas pessoas que dependem de mim. Respondeu ele com um olhar cansado.

- Eu posso te dar ou se quiser, te emprestar. O quanto precisa? Perguntou ela naturalmente.

- Assim, você me ofende. Eu não quero o seu dinheiro. Eu quero trabalhar para ganhar. Sempre fiz isso e continuarei fazendo. Respondeu J.D. em um tom mais áspero que o normal.

- Ok, ok, não vou insistir e não precisa se ofender, vou falar com ele e te falo daqui a pouco. Tudo bem assim?

- Claro, muito obrigado. Não estou ofendido, agradeço a demonstração de solidariedade, mas eu prefiro ganhar meu próprio dinheiro, você me entende?

E ela desceu as escadas e foi ter com o pai no escritório. Seu pai estava atrás da mesa, falando ao telefone e ela esperou atrás da porta pacientemente o pai desligar.

- Pai, posso entrar? Perguntou ela receosa.

- Pode, mas seja rápida, estou ocupado. Disse ele rispidamente.

- Sabe aquele amigo que eu te disse que entende muito de computadores?

- Sei, aquele brasileiro que não aceitou nosso convite para trabalhar. Respondeu secamente o pai, com expressão de poucos amigos.

- Sim, ele mesmo. Ele me pediu para lhe perguntar se ainda está precisando de alguém. E olhando para baixo, aguardou a resposta.

No momento que o pai ia responder, tocou o seu computador para fazer uma chamada de vídeo, e acenando para ela, pediu para que se retirasse e fechasse a porta, fazendo com que ela saísse sem sua resposta.

Seu pai já não estava com uma boa expressão quando ela havia feito a pergunta, mas quando ele viu quem estava ligando para ele, definitivamente piorou, sua pele ficou branca igual papel e ela pode perceber até um certo tremor nas mãos, estranhando o “medo” que seu pai esboçou e não sendo nenhum pouco característico de sua personalidade, ela resolveu ficar esgueirada atrás da porta para ver se conseguia ouvir com quem seria aquela conversa.

Ela conseguia perceber que seu pai estava muito nervoso, a voz trêmula e em tom alto, revelava qualquer dúvida que ela podia ter diante do sentimento que ela havia percebido no momento anterior. Ela podia ouvir coisas sobre eleições, apoio, programas, vírus, estados, Brasil e pensou em primeiro momento se tratar de mais um político pedindo o apoio de seu pai, o qual ele nunca dava, mas quando ela ouviu o nome dela e em seguida a palavra morte, chegou à conclusão que algo de bem errado estava acontecendo ali.

Ele podia estar falando de diversos assuntos, inclusive de morte, pois era o que mais falava em todos os telejornais por causa do vírus, mas a forma como ele estava exaltado e a citação do nome dela, fez com que ela desconfiasse de algo maior.

Quando seu pai desligou o telefone, ela o ouviu levantar da cadeira e correndo até a cozinha para disfarçar seu interesse, viu quando o pai, pegou a chave do carro e saiu, dispensando o motorista e não informando para ninguém onde ia. Ele nunca fazia isso.

Karine, após virar o copo de água que estava nas mãos em uma golada só (depois de tudo que estava acontecendo com o vírus, decidiu abandonar os refrigerantes em nome de melhorar a sua saúde), subiu as escadas correndo e chamou J.D.

- J.D., tenho um trabalho para a gente.

- Seu pai disse que me aceita? Perguntou ele tentando esconder a euforia.

- Não. Ele não me respondeu. Eu estou te contratando. Respondeu ela de forma apressada.

- Mas você não precisa de mim. Você só está querendo me dar dinheiro. Respondeu ele já em tom de negativa.

- Não é isso não. Eu realmente quero te contratar, preciso de sua ajuda. E contou a ele tudo que havia ouvido e como seu pai saiu depois.

- J.D., pensou, coçou seu queixo. E disse ok, eu aceito. Vamos brincar de detetives novamente.

- Maravilha, disse ela, feliz e preocupada ao mesmo tempo.

- Nós vamos contar para o pessoal no que vamos trabalhar? Perguntou ele.

- Eu acho que podemos guardar entre nós por enquanto, depois que os arquivos sumiram naquela época, eu não sei bem em quem confiar e como se trata do meu pai, eu gostaria de ter mais informações. Disse ela de forma sincera.

- Acho que está certa. Respondeu ele, se perdendo em seus pensamentos.

 

Raquel, após o sumiço dos arquivos de Win, não tinha provas para incriminar ninguém, e continuou trabalhando no hospital todos aqueles meses. Com dedicação, mas com desapontamento, sabia que poderia estar resolvendo todo aquele problema, pois com o conhecimento da ciência de como foi desenvolvido o vírus, uma equipe competente poderia chegar na cura ou até numa vacina, realizando engenharia reversa. Se sentia culpada pelo mundo todo estar em busca de uma vacina ou uma cura, que chegou a estar tão perto de suas mãos.

Ela já havia chorado muito por isso, mas depois, talvez para dar uma desculpa a si mesma, começou a pensar que talvez fosse melhor assim. Ela não tinha nada a ver com aquilo, talvez fosse perigoso para ela deter tantas informações e saber de onde tinha surgido o vírus, talvez não fosse a melhor saída daquela pandemia.

Mas ela não conseguia apagar de seus pensamentos tudo que ela havia vivido até ali. O professor Win não parecia ser uma má pessoa, ele não poderia estar envolvido em algo tão sórdido como o que ela imaginou ao ler seus relatórios. Talvez tivesse sido obrigado. Talvez ele tivesse descoberto algo e quisesse salvar as pessoas em vez de matá-las. Esses pensamentos invadiam a sua mente e cada vez mais o misto de deixar para lá e querer saber mais, se misturavam.

Um dia, caminhando pelo corredor do hospital, esbarrou com dois médicos de características ocidentais, os quais nunca havia visto, saindo da sala da diretora. Eles a olharam de rabo de olho e sem pedir desculpas e em silêncio, continuaram em direção ao banheiro.

Raquel, achou estranha a atitude deles e ficou escondida, esperando o momento que eles sairiam. Eles saíram do banheiro com uma expressão mais leve e caminharam até a porta de saída, dando risada e falando algumas coisas em inglês que Raquel não entendeu. Raquel então pensou que devia se tratar de médicos estrangeiros recém contratados ou talvez de candidatos que estavam sendo entrevistados para trabalhar no hospital, até porque, médicos sempre estavam faltando com aquela pandemia.

Mas ao olhar através da porta de vidro da entrada do hospital, viu quando um deles abaixou para entrar no carro e o jaleco se abriu, mostrando o que ela tinha certeza, ser uma arma.

- O que faria um médico armado? Perguntou Raquel a si mesma em pensamento.

- Eu estava certa. E a diretora faz parte de tudo isso e desde o início. Afirmou ela a si mesma.

A única coisa que ela sabia da diretora era seu nome e o seu registro no Conselho de medicina da China que constava em todos os receituários e relatórios.

Mas ela precisava saber mais.

Ali no hospital, ela não tinha amigos e mesmo que tivesse, seria difícil contar o que estava acontecendo e as suas suspeitas. Não dava para saber em que confiar.

Fazer uma investigação dessa sozinha, seria impossível, mas ela não podia confiar em mais ninguém, o sumiço do relatório de Win, a fez com que ela não tivesse certeza de quem ela poderia confiar no grupo.

Ela precisava ter alguém influente, que conhecia muita gente e entendesse bastante de computadores. Ser tímida nessas horas não era bom, pois não facilitava as amizades. Até que se lembrou de uma amiga que tinha conhecido a um tempo atrás, quando fez um intercâmbio na Itália e se ela continuava como era, parecia ter sempre bons contatos.

Quando voltou para casa, Raquel procurou os últimos telefones que a amiga havia deixado com ela antes de partir e tentando ligar, as chamadas não completavam, ligou no local que elas ficaram juntas por um tempo e a única coisa que conseguiu saber é que Isa tinha voltado para o Líbano. Começou a procurá-la por todos as redes sociais que conhecia e nada de sua amiga. Era estranho, ela parecia tão tecnológica e agora parecia ter sumido do mapa.

Ficou preocupada pensando que a amiga poderia estar em meio àquela explosão que havia tido há alguns meses em Beirute e seu coração apertou.

Com poucas esperanças de achá-la, mas em busca de quaisquer pistas, procurou através da internet, os jornais locais, fotos, artigos e mesmo a não compreensão do idioma, não a parava, imaginando que reconheceria pelo menos o nome e caindo numa espécie de obituário, observou com cuidado, torcendo para não encontrar, o nome da amiga querida.

Percorrendo a infindável lista de nomes atentamente, sentiu-se aliviada percebendo que o nome de Isa não estava lá, respirou aliviada por alguns momentos.

Buscando por mais notícias, estranhamente chegou em uma foto em um blog de uma jornalista brasileira, que lhe era muito conhecida. Liz.

E na foto, surpreendentemente, estava sua amiga de perfil, pelo menos parecia ela, abraçada com um moço bem vestido e com o corpo curvado como se estivesse chorando, olhando em direção ao porto totalmente destruído.

- Será que era mesmo ela na foto? Liz devia ter comprado a foto de um fotógrafo local. Pensou ela. Será que o fotógrafo a conhecia? Ou seria somente estas fotos para nos emocionarem diante do desastre?

Eram tantas perguntas, sem resposta. Primeiro era o professor Win, depois a Diretora, os homens armados no hospital, agora a foto de Isa no blog da Liz, lembrou de Raissa, que também era do Líbano e que após a explosão não tinha mais se comunicado com o grupo.

Não restava alternativas, ela teria que perguntar para Liz sobre a foto e pegar o telefone do fotógrafo. Talvez Liz soubesse o paradeiro de Raissa e com a ajuda dela, pudesse achar sua amiga. Ela começou a pensar que sua busca por Isa a faria perder um tempo precioso, que poderia estar sendo usado para investigar a ligação da diretora com o professor Win, mas alguma coisa dentro dela, a impulsionava a procurar por ela. Apesar de não ter sentido nenhum, parecia que tudo tinha uma ligação. Pensava em qual desculpa iria inventar para perguntar para Liz sobre a foto, pois não confiava mais nela, meses depois que os documentos sumiram, Liz teve uma rápida ascensão na carreira e Raquel desconfiava que Liz tivesse envolvida no sumiço dos arquivos, talvez em troca de dinheiro. Raquel sempre achou Liz muito honesta, que não parecia ser dessas pessoas, mas depois de tantas pessoas ao seu redor, não parecerem o que realmente são, ela não se surpreenderia mais com nada.  

 E rabiscando em seu pequeno caderno de anotações, os poucos indícios que tinha do paradeiro de Isa e os únicos dados que possuía da diretora, foi tomada pelo cansaço e permitindo que seus olhos se fechassem, cruzou os braços e abaixou sua cabeça, apoiando em cima da pequena mesa, como tantas vezes havia feito como estudante.

 

 “Enquanto eu respiro há esperança “